Sindicato Nacional dos Trabalhadores de Pesquisa e Desenvolvimento Agropecuário
Embrapa - Imagem com fundo branco. Do lado direito um carimbo de madeira virado. Do lado esquerdo um quadro com borda preta como se tivesse carimbado. Escrito: Sem o Direito de Assinar.

Autoria Negada: A Embrapa e a injustiça contra Assistentes e Técnicos nas publicações científicas

3 de outubro de 2024
Por: Gisliene Hesse

A questão do reconhecimento dos Assistentes e Técnicos em créditos em publicações científicas é uma das cláusulas sociais prioritárias elencadas pela Comissão Nacional de Negociação do SINPAF (CNN do SINPAF) nas tratativas do Acordo Coletivo de Trabalho 2023-2024 (ACT 2023-2024).

Essa reivindicação da pauta dos/das trabalhadores/as visa corrigir uma injustiça com os que desempenham um papel essencial nos projetos de pesquisa da empresa, mas não têm garantido os seus créditos em publicações.

Sob a justificativa de que o Plano de Carreiras (PCE) rege essa questão, a Embrapa recusa a aprovação dessa cláusula, mesmo ela sendo de grande relevância para os Técnicos e Assistentes e não interferindo economicamente a empresa.

A cláusula proposta e a resistência da Embrapa

A proposta do SINPAF para o ACT 2023-2024 busca garantir que Assistentes e Técnicos possam ser reconhecidos como autores ou coautores em publicações científicas, independentemente das restrições impostas pelo Plano de Carreiras da Embrapa (PCE).

 Essa proposta não envolve custos financeiros para a empresa, uma vez que se trata de uma alteração normativa, e visa somente o reconhecimento de profissionais que contribuem intelectualmente para os trabalhos.

No entanto, a Embrapa insiste em manter a questão da autoria vinculada ao PCE, que atualmente exclui cargos não classificados como pesquisadores e analistas do direito à autoria. Essa postura da empresa reflete uma resistência em valorizar formalmente esses profissionais, apesar das claras contribuições técnicas e intelectuais que oferecem. Ao não reconhecer os Assistentes e Técnicos, a Embrapa subestima o impacto que esses trabalhadores/as têm no sucesso de seus projetos de pesquisa.

A importância do reconhecimento em publicações científicas


Os Assistentes e Técnicos da Embrapa são profissionais altamente capacitados, muitos com formação acadêmica avançada, como mestrado e doutorado. Eles desempenham funções indispensáveis, desde a coleta e análise de dados até a execução de experimentos e elaboração de relatórios, que muitas vezes culminam em publicações científicas. Apesar de seu envolvimento em diversas fases dos projetos de pesquisa, esses profissionais não são formalmente reconhecidos como autores ou coautores dos trabalhos publicados.

Como bem destaca Franciana Volpato, Diretora de Políticas Sociais e Cidadania do SINPAF, “negar a autoria a esses profissionais é invisibilizar parte fundamental do processo científico. O reconhecimento não apenas eleva a qualidade do trabalho, mas também gera um ciclo virtuoso de valorização e incentivo à produção científica dentro da empresa.”

O reconhecimento em publicações não é uma questão de justiça, mas também de valorização profissional. Ser creditado como autor ou coautor contribui para o crescimento acadêmico e profissional desses trabalhadores, influenciando suas carreiras e possibilidades de ascensão, além de fortalecer o senso de pertencimento e importância no processo de inovação e desenvolvimento científico.

“É muito injusto a Embrapa se aproveitar do intelecto do assistente e do técnico, mas esses empregados/as não podem colocar os nomes deles nos projetos e trabalhos apresentados”, criticou Franciana Volpato.

A postura do SINPAF e a luta pelo reconhecimento

O SINPAF, em conjunto com as demandas dos/das trabalhadores/as, tem lutado pelo reconhecimento desses profissionais e acredita que a questão não deve ser vista como privilégio, mas como direito. Por isso, em vários momentos das tratativas do ACT da Embrapa 2023-2024, a CNN do SINPAF tem atuado para explicar à Embrapa sobre a importância da Cláusula. Para além das negociações, a diretoria nacional do SINPAF já tratou da questão em reunião com a diretoria da Embrapa e, conforme combinado, oficializou a empresa sobre o assunto (veja mais sobre a reunião aqui). No entanto, não teve resposta até hoje.

Segundo David Regis, integrante da CNN do SINPAF que representa a região Sudeste, os Assistentes e Técnicos atuam em diversas áreas de suporte aos pesquisadores, contribuindo de forma direta para a qualidade e robustez dos estudos científicos. “A exclusão desses profissionais do reconhecimento como autores é uma falha que deve ser corrigida, especialmente quando consideramos que muitas outras instituições públicas e privadas já adotam práticas mais inclusivas. Isso prova que a Embrapa quer deixar os Assistentes e os Técnicos no limbo”, afirmou David Regis. 

Além disso, o SINPAF ressalta que o reconhecimento da autoria em publicações científicas é um princípio defendido por organizações de prestígio, como a Associação Brasileira de Editores Científicos (ABEC). Segundo Sigmar de Mello Rode, presidente da ABEC, o critério de autoria deve contemplar todos os que contribuíram substancialmente para a produção científica, e não apenas os pesquisadores formais. Isso reflete uma visão moderna e justa da ciência, onde a colaboração entre diferentes categorias profissionais é reconhecida (veja o artigo completo aqui).

Internacionalmente, o Comitê de Ética em Publicações (COPE) estabelece que para ser considerado autor, é necessário ter feito uma “contribuição substancial para o trabalho” e ser responsável pela sua forma final (veja o artigo sobre autoria em publicações em inglês aqui). A visão do Comitê reforça a defesa do SINPAF de que os créditos dos Técnicos e Assistentes nas publicações deve ser reconhecido, visto que eles participam ativamente do desenvolvimento e execução de diversos trabalhos.

Outra questão trazida no artigo da COPE é sobre a importância da autoria para o sucesso da carreira. Segundo o Comitê, o reconhecimento como autor poderá influenciar diretamente as oportunidades de carreira dos profissionais.

Para o SINPAF, a postura contradiz o discurso da empresa em relação à valorização de seus trabalhadores e trabalhadoras e o papel da pesquisa científica para o desenvolvimento do país. Ignorar a importância desses profissionais no processo de construção do conhecimento científico é negligenciar um dos pilares do sucesso institucional da Embrapa.

Para o SINPAF, a negativa da Embrapa para aceitar essa mudança no ACT revela uma postura conservadora e desatualizada. “O que está em jogo na luta pelos créditos em publicações científicas para Assistentes e Técnicos é muito mais do que o simples reconhecimento em artigos e trabalhos acadêmicos. Trata-se de uma questão de valorização profissional, justiça e equidade dentro da Embrapa. A concessão de autoria não traz custos para a empresa, mas traria um enorme ganho em termos de motivação, reconhecimento em ambiente de trabalho”, completa David.

Leia mais