Em meio à pandemia causada pela Covid-19, o desejo de retorno às atividades presenciais é ensejado por uma pretensa normalidade da vida cotidiana. No entanto, não nos encontramos próximos ao que seria uma situação normal, pelo contrário. Em função dessa doença, continuamos a perder vidas diariamente e, a todo momento, ressalta-se a possibilidade de uma nova onda pandêmica, em meio ao aparecimento de outras cepas potencialmente letais.
O Brasil ultrapassou a marca de 500 mil mortos, com vítimas cada vez mais jovens, e com menos fatores de risco. Por outro lado, até o momento, vacinamos apenas 31% da população, com pelo menos uma dose, e, na maior parte do país, a vacinação segue a passos lentos. Por tudo isso, a questão do retorno ao trabalho presencial é uma preocupação.
Nesse sentido, a Organização Mundial da Saúde (OMS) organizou, em 29 de maio, seminário virtual sobre o tema, estabelecendo os seguintes critérios para que o retorno em nível global se dê em condições seguras:
- A vigilância deve ser forte, o número de casos de Covid-19 deve estar em declínio e a transmissão controlada;
- O sistema nacional de saúde deve ter a capacidade de detectar, isolar, testar e tratar todos os casos e rastrear todos os contatos.
- Os riscos de surtos devem ser minimizados em ambientes especiais, como unidades de saúde e asilos;
- Medidas preventivas devem ser implementadas em locais de trabalho, escolas e outros locais onde a circulação de pessoas seja essencial;
- Os riscos de importação do vírus devem ser gerenciados e controlados;
- A sociedade deve estar plenamente informada, engajada e empoderada para aderir às novas normas de convívio social.
A premissa básica para o retorno é, portanto, assegurar as condições necessárias para a recuperação do sistema de saúde e para o controle da pandemia, sendo a retomada progressiva das atividades a etapa seguinte.
Seguindo esses requisitos, a cidade de Nova York, nos Estados Unidos, iniciou no dia 8 de junho sua reabertura, de acordo com parâmetros e indicadores definidos pelo Centers for Disease Control and Prevention (CDC): declínio do total de hospitalizações, diminuição dos óbitos, número de novos casos de hospitalizações inferior aos limites estabelecidos, número de leitos de enfermaria e de UTI disponíveis, capacidade diagnóstica por testagem, capacidade de rastreamento de contatos. Além disso, os gestores da cidade criaram mecanismos para garantir segurança dos usuários dos transportes públicos, pois eram esperados 400 mil trabalhadores na primeira das quatro etapas previstas para a retomada das atividades.
Por outro lado, países como Brasil, México, Índia e Rússia estão voltando às atividades econômicas sem se adequarem aos protocolos da OMS. O recente caos observado em algumas cidades do Brasil mostra que, no contexto de reabertura econômica, sem que sejam observadas as premissas necessárias, o problema não se limitará aos espaços de trabalho, colocando em risco, não apenas a população trabalhadora, mas a população como um todo. Além disso, a não adequação gera o efeito pingue-pongue, em que a abertura não é definitiva e, à medida que a situação vai fugindo ao controle, novos fechamentos são realizados.
Segundo a Organização Internacional do Trabalho (OIT), o retorno ao trabalho presencial deve ser considerado, e posteriormente implementado, como política pública que coordena e regula as ações nas empresas e instituições. Entretanto, no Brasil, da mesma forma que não tivemos um organismo centralizador das operações voltadas ao controle da pandemia do Covid-19, também não temos um ente que organize o retorno seguro de forma planejada. Por isso, as iniciativas terminam sendo de caráter local e discricionárias.
No dia 15/06, a Diretoria-Executiva da Embrapa comunicou, no informativo Todos.com, as datas atualizadas para retorno às atividades presenciais na empresa, ainda em 2021. Segundo publicado, o cronograma anunciado atende a uma sugestão dos gestores das unidades da empresa.
Com a chamada “Embrapa se prepara para volta de todos os empregados ao trabalho presencial”, a diretoria indicou que o retorno deverá acontecer de forma escalonada, nos dias 1° de setembro, 4 de outubro e 3 de novembro, sendo os primeiros a retornar as trabalhadoras e os trabalhadores que hoje estão em regime de revezamento e também aqueles que ocupam cargos em comissão, função de confiança e, ainda, os que têm funções de supervisão. Nas datas subsequentes retornam aqueles que exercem atividade-fim; trabalhadores e trabalhadoras que expressem desejo de voltar; e, por fim, na última data, aqueles que não fazem parte dos grupos anteriormente elencados.
Na segunda-feira, 21 de junho, a decisão foi ratificada no Boletim de Comunicações Administrativas (BCA) da Embrapa.
Se no curto prazo, tal decisão traz um certo alívio por adiar em quase ou pouco mais de dois meses as datas de retorno anteriormente previstas, ela permanece como elemento de incerteza e medo para a categoria. Nesse contexto, o processo progressivo de retomada necessita de organização robusta e muitos cuidados, sobretudo nos locais de trabalho.
É preciso ter em mente que a pandemia não é circunscrita às instalações da Embrapa. Para uma decisão dessa natureza é imprescindível considerar as condições do país e dos locais onde estão sediadas as unidades da empresa, especialmente quanto à porcentagem da população vacinada, ao ritmo da vacinação e o acesso às vacinas.
Ainda que se explicite que a empresa está avançando nos preparativos para o retorno presencial com segurança (a propósito, onde constam esses preparativos e o tal plano de retorno seguro?), é necessária uma avaliação e preparação de caráter mais macro.
É muito importante a publicização da avaliação de riscos, devidamente elaborada por equipe preparada. Como serão tratados os trabalhadores e trabalhadoras que utilizam serviços públicos de transporte? Como será organizada a circulação das pessoas na empresa? Como serão escalonados os horários das refeições? Como foram equacionadas as condições de trabalho presencial na atual situação, incluindo questões de saúde mental? Como e quando serão retomados os exames periódicos?
Por outro lado, dentro de uma política de retomada das atividades, as condições e planejamento, para tanto, precisam ser discutidos não somente com gestores, mas, principalmente, com a comunidade profissional do campo da Segurança e Saúde do Trabalhador (SST) e com a representação dos trabalhadores e trabalhadoras, em uma ação devidamente coordenada para se detectar acertos e/ou falhas nas medidas protetivas a serem adotadas e para propor medidas corretivas, caso necessário. Com isso se promove o diálogo, ampliam-se os canais de informação, ao mesmo tempo em que se cria um clima de segurança para o retorno presencial.
Para a vice-presidenta e atual diretora de Saúde da Trabalhadora e do Trabalhador do SINPAF, Alexandra Wickboldt Hellwig, a novas condutas no dia a dia devem ser cumpridas por todas e todos, assim como os hábitos comuns que eram realizados no cotidiano como cumprimentar com as mãos, abraçar ou emprestar uma caneta para um colega de trabalho, deverão ser evitados nos tempos atuais. Pode parecer algo bastante exagerado, porém as mais de 500 mil vítimas do novo Coronavírus, com certeza chocam bem mais do que explicar a alguém do porque não compartilhar nada de uso pessoal.
De acordo com a diretora, as medidas preventivas como uso de máscara, higienizar as mãos com água e sabão, uso do álcool em gel 70°, manutenção do distanciamento / isolamento social, entre outras medidas, já fazem parte da nossa rotina há mais de um ano, e com o cenário em que o Brasil está, serão medidas que continuarão vigentes por muito tempo, até que a vacinação seja uma realidade para toda a população.
“Precisamos exercitar diariamente que estamos lidando com uma situação que requer total companheirismo, pensando sempre que a conduta adequada que tomamos, além de garantir a sua saúde, também pode preservar a vida de tantas outras pessoas que estão ao nosso redor", afirmou Alexandra Wickboldt, vice-presidenta e atual diretora interina de Saúde do trabalhador/a.
As questões aqui apresentadas trazem a análise do retorno ao trabalho presencial sob uma perspectiva central: há que se voltar, porém, com segurança. Para tanto, a população precisa estar devidamente imunizada, pois só assim o retorno será seguro. No momento, especialistas afirmam que os números da vacinação no Brasil estão longe de oferecer uma proteção coletiva para a população.
O SINPAF continua trabalhando em defesa da vida de todas (os) trabalhadoras (os) da nossa base!