Sindicato Nacional dos Trabalhadores de Pesquisa e Desenvolvimento Agropecuário

Advogado esclarece ação sobre isonomia de benefícios dos trabalhadores da Embrapa

25 de janeiro de 2017
Por: Rogério Rios

O processo ataca resolução que reduziu direitos sociais e trabalhistas previstos em acordos coletivos de trabalho, normativas internas da empresa, bem com os planos de cargos e salários

 

A Diretoria Nacional do SINPAF acionou a Justiça do Trabalho contra a Embrapa para suspender a Resolução Nº 9, de 1996, editada pelo Conselho de Coordenação e Controle das Empresas Estatais, órgão vinculado ao Ministério do Planejamento, Desenvolvimento e Gestão, que reduziu direitos trabalhistas e sociais dos empregados contratados depois da edição do documento.

O objetivo da ação é que a resolução seja reconhecida como ilegal e inconstitucional, já que fere o princípio geral do Direito da Isonomia, no qual todos são iguais perante a lei, não devendo ser feita nenhuma distinção entre pessoas que se encontrem na mesma situação trabalhista.

De acordo com Rodrigo Castro, da RM Advogados, que é um dos responsáveis pela ação do SINPAF, a resolução direcionada para todas as empresas públicas buscava reduzir direitos sociais e trabalhistas previstos em acordos coletivos de trabalho, normativas internas das empresas, bem com os Planos de Cargos e Salários (PCS). Com isso, dentro da Embrapa, trabalhadores que exercem as mesmas funções passaram a não receber os mesmos benefícios como, por exemplo, o adicional de insalubridade e periculosidade, que ficou limitado ao piso pago para a categoria, entre outros direitos que foram excluídos.

Confira, a seguir, a entrevista completa com o advogado Rodrigo Castro:

 

SINPAF – Qual é o objetivo da ação ajuizada pelo SINPAF?

Rodrigo Castro – Com essa reclamação trabalhista, que está ajuizada aqui no Distrito Federal e que tramita, hoje, na 12ª Vara Federal, o Sindicato tem como objetivo ver reconhecida a ilegalidade e a inconstitucionalidade da Resolução Nº 9, de 1996, editada pelo Conselho de Coordenação e Controle das Empresas Estatais, que é um órgão vinculado ao Ministério de Planejamento, Orçamento e Gestão.

Essa resolução, na época, criou uma limitação destinada a todas as empresas públicas para que houvesse uma redução dos direitos sociais e trabalhistas, basicamente aqueles previstos em acordos coletivos de trabalho, normativas internas das empresas, bem com os planos de cargos e salários.

Para termos uma ideia, essa normativa do ministério buscou limitar ao piso os direitos garantidos na lei, como adicionais de insalubridade e periculosidade, que a categoria conseguiu ao longo dos anos numa negociação com a empresa. Esse benefício foi taxado e reduzido ao piso.

A resolução pretendeu, também, estabelecer a alteração, tanto dos planos de cargos e salários, quanto das normativas internas da empresa. Então, todos aqueles que entraram antes da resolução mantiveram os seus direitos nos patamares que estavam ali negociados nos acordos coletivos e nas normas internas das empresas. Àqueles que vieram e foram admitidos posteriormente à resolução tiveram toda essa limitação e esse óbice (impedimento) à autocomposição nas negociações coletivas dos empregados.

Então, o objetivo básico é garantir uma isonomia entre os trabalhadores, para aqueles que foram admitidos antes ou depois da resolução, e, também, para que não haja limitação à negociação dos trabalhadores com a empresa.

 

SINPAF – Qual o embasamento legal para o ingresso dessa ação? Existe jurisprudência a respeito do assunto?

Rodrigo Castro – Nós trazemos nessa reclamação trabalhista dezenas de teses para justificar o entendimento da ilegalidade e da inconstitucionalidade dessa resolução. As principais teses são, basicamente, a questão da isonomia, que os trabalhadores não podem ser diferenciados pela data de admissão, sendo que eles têm os mesmos direitos, segundo a lei, e eles trabalham e exercem as mesmas atividades. Então, só a data de admissão deles não é suficiente para criar essa discriminação entre os trabalhadores.

Para termos uma ideia, a “licença-prêmio”, por exemplo, estabelecida no PCS de 1998, só é devida àqueles trabalhadores que foram admitidos até 1997; os que foram admitidos depois não têm direito a essa licença. Então, cria-se uma situação anti-isomômica e é o que a gente quer ver reconhecida nessa ação.

Outros foram os elementos que nós trouxemos para análise do poder judiciário para caracterizar a ilegalidade e inconstitucionalidade como, por exemplo, a de que a Constituição Federal de 1988 determina que compete à União legislar e tratar de matérias trabalhistas. Então, não poderia o Ministério do Planejamento editar uma resolução porque haveria a necessidade de existir uma lei para isso e precisaria passar por todo o trâmite legislativo normal para a edição dessa lei.

As resoluções servem para disciplinar algo que esteja em lei, ela não pode trazer regramento de modo a restringir direitos que a lei não faz. Nesse caso específico, não existe uma lei trazendo essa restrição. Ao contrário, a Constituição garante o direito ao trabalhador a essa autocomposição, que seria o ACT. Então, ela determina que esse acordo coletivo seja respeitado. Inclusive a Organização Internacional do Trabalho (OIT), na resolução e nas convenções já chanceladas por nosso Estado, critica fortemente qualquer tipo de resolução ou ato normativo que tende a negar validade a esses acordos coletivos de trabalho, e não só aos ACTs, mas às resoluções internas das empresas, aos normativos internos e aos planos de cargos que também não poderiam limitar de forma unilateral os direitos sociais garantidos para o trabalhador.

O Tribunal Regional do Trabalho aqui da 10ª Região (do Distrito Federal e Territórios), em caso semelhante ajuizado pela Federação Nacional dos Portuários, também acompanhado por nosso escritório, entendeu que realmente essa resolução é nula porque violaria frontalmente os princípios constitucionais de proteção aos direitos de trabalho. Então, o tribunal declarou a nulidade da resolução, no sentido de que ela não poderia trazer uma limitação a esse poder do trabalhador para negociar seus direitos trabalhistas e sociais.

E é importante destacar que essa autocomposição vem como um princípio do Direito do Trabalho para tornar mais equânimes (semelhantes) as forças entre o empregador e o empregado porque você tem uma força desproporcional e precisa ter elementos e princípios protetivos para que os trabalhadores consigam discutir avanços sociais, os seus direitos e garanti-los de forma a manter historicamente toda uma luta da classe, que foi travada com a empresa para garantir esses direitos sociais.

Então, existe, sim, uma jurisprudência nesse sentido e vamos aguardar para ver o pronunciamento do poder judiciário que, se seguir a mesma lógica e esse mesmo entendimento, provavelmente declarará a nulidade dessa resolução também.

 

SINPAF – Houve um cancelamento da audiência que estava marcada para o dia 20 de setembro do ano passado. Por quê?

Rodrigo Castro – Na justiça do trabalho, existe uma audiência que é a inaugural, na qual é permitido fazer um acordo entre as partes e também fazer a produção de prova oral, por exemplo. Então, o juiz entendeu que, nesse caso, por se tratar de uma discussão eminentemente de direito, não haveria necessidade de ter essa prova oral, nem a necessidade de se fazer uma audiência para tanto e que abrisse logo o prazo para a União de manifestar, se defender, apresentar uma contestação à nossa petição inicial.

Assim, ele cancelou essa audiência e já passou para a próxima fase, que seria a fase de prolação da sentença. E, por isso, hoje em dia, o processo está aguardando para ser concluso, para que o juiz possa analisar o caso e sentenciar a nossa ação e decidir de uma vez por todas se temos razão, ou não, nas nossas alegações.

É lógico que dessa decisão, sendo positiva ou negativa, ainda cabem recursos, mas essa fase é a que ele vai sentenciar e decidir definitivamente o nosso processo.

 

SINPAF – Existe a possibilidade de intervenção da União? Por quê?

Rodrigo Castro – Na verdade não é uma intervenção da União porque, como o Ministério do Planejamento não tem personalidade jurídica própria, quem o assessora ou defende é a União. Então, a ação, apesar de estar discutindo a ilegalidade de um ato exarado (redigido) pelo Poder Executivo e pelo Ministério do Planejamento, quem faz a defesa dele no processo é a União. Então, ela que vai ser chamada a se defender e, através dos seus advogados, vão contestar a nossa ação e defender na medida em que acharem necessário.

 

SINPAF – E quais são as expectativas em torno dessa ação?

Rodrigo Castro – Nós temos boas expectativas porque entendemos que a tese que trazemos na ação é forte, que realmente essa resolução extrapola a competência que o poder executivo tem para editar esse tipo de resolução, ele entra em uma esfera, por exemplo, que trata da reserva legal.

A Constituição garante ao Congresso Nacional a competência para legislar sobre essas questões trabalhistas.  Nada mais natural porque a Constituição de 1988, chamada de Constituição Cidadã, buscou proteger esses direitos sociais e esses direitos trabalhistas. Por isso, há a necessidade, sim, de ter a edição de uma lei para que haja uma limitação desses direitos trabalhistas e sociais. E, a não ser por via de Lei, não poderia o Poder Executivo num ato unilateral fazer essa limitação.

Nós também temos boas expectativas porque o Tribunal Regional da 10ª Região já se pronunciou exatamente em relação a essa resolução, apesar de ter sido em outra categoria que estava discutindo o processo, no sentido de declarar a nulidade da resolução.

Então, as perspectivas são as melhores possíveis, mas a gente tem aquele elemento humano que é o juiz, o Poder Judiciário, que vai fazer a análise e vai se convencer acerca das teses apresentadas pelo SINPAF, na petição inicial, ou pela União, na sua contestação. Nesse confronto das teses, ele vai exarar uma decisão, julgando pela legalidade ou pela ilegalidade da resolução.

 

SINPAF – Quais serão os reflexos dessa ação em caso de êxito? Os benefícios, por exemplo, serão retroativos à data de ingresso da ação ou à data de admissão do empregado?

Rodrigo Castro – No Direito do Trabalho, nós temos a figura da prescrição quinquenal. O que significa que essa discussão só vai retroagir até os cinco anos anteriores ao ajuizamento da ação. Então, esse vai ser o termo em que vamos discutir qualquer tipo de efeito dessa ação.

Como a ação busca a declaração de nulidade, ao ser declarada nula, a resolução é retirada do universo jurídico. Assim, vários são os efeitos que podem decorrer a partir daí, no sentido de buscar novamente a igualdade e a isonomia dos trabalhadores da Embrapa que, hoje, contam com essa diferenciação. O próprio plano de cargos e salários da Embrapa traz a resolução como elemento justificador das suas alterações para limitar os direitos sociais e vários outros direitos. Esse é o fundamento utilizado pela empresa, que teve que fazer essa alteração pelo que constava na resolução. Então, os efeitos serão determinados pelo juiz, mas eles sempre retroagirão nesse prazo quinquenal.

Existe uma possibilidade, também, de que essa ação provavelmente tramite até o Tribunal Superior de Trabalho (TST) e, lá, o tribunal pode fazer o que se chama de modulação de efeitos. Dependendo do impacto que isso pode gerar na ação, o ministro do TST pode modular os efeitos, ou seja, criar marcos temporais diferentes para os efeitos dessa ação.

Mas isso tudo a gente vai precisar aguardar o trâmite do processo e as decisões judiciais para estabelecer exatamente quais são os efeitos e o alcance de uma possível declaração de nulidade da resolução.

 

Número do Processo: 0001126-89.2016.5.10.0012 – 12ª Vara Federal

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